Um famoso dicionário traz uma boa definição de ´ergonomia´: ´É a soma de duas palavras gregas: ergon (trabalho) e nomos (normas). Em linhas gerais, ergonomia é uma ciência que visa o entendimento da relação das pessoas com as máquinas, equipamentos e condições de trabalho´.
Principalmente por ser apaixonado pelo universo automotivo, sempre fico admirado com essa questão, com os porquês de um ou outro produto obterem sucesso ou não. Após testar centenas de veículos, hoje percebo um projeto ergonômico de uma maneira muito aguçada. Em resposta ao conforto (ou desconforto) que uma posição de dirigir causa à minha altura de 1,77 m, acredito que posso identificar erros e acertos nesse aspecto.
A primeira coisa que observo num carro é a inclinação e a altura da ´coluna A´ (aquela moldura lateral que comporta o para-brisa frontal). Na picape RAM Rampage, por exemplo, por ser baixa demais, ela dificulta a entrada e saída do motorista e do passageiro ao habitáculo do veículo. A cabeça pode bater naquele ponto. Já a nova geração da Ford Ranger é acertadíssima nesse aspecto.
Ao sentar no banco do motorista é necessário sentir a acomodação das costas, ombros, braços e da bunda! Sim: as nádegas têm que estar confortáveis. As mãos têm que ter alcance facilitado aos botões, teclas, alavanca de câmbio etc. Se o motorista precisar de muitos contorcionismos para ajustar a posição de dirigir ao seu gosto, o trabalho de ergonomia não foi bem feito. Os olhos precisam captar, no mínimo, um bom campo de visão em todas as direções. A picape Fiat Toro oferece uma péssima visibilidade traseira, assim como os caminhões Scania sempre forneceram excelentes ajustes para o condutor.
Antigamente, a italiana Fiat era imbatível em ergonomia. A Alfa Romeo, também. A Itália tem tradição de charme e bom gosto em objetos variados. Naquele país, os móveis, cafeteiras, relógios, carros, roupas e artefatos de cozinha fogem do lugar tradicional para mergulhar na espiral do encantamento artístico. A Fiat perdeu-se nesse campo, pois hoje os seus carros são comuns por dentro e por fora. Que o diga o modelo Fastback com a sua horrorosa carroceria. A picape compacta Strada é uma exceção, já que o seu design (sempre em evolução) e a sua arquitetura interna são favoráveis. Por isso o seu sucesso.
A complexa ciência da ergonomia tem que existir e ser feita para contentar uma média populacional. Nem tudo agradará a todos. Somente em raríssimas exceções, isso acontece. Por exemplo: o funcional copo americano (criado pelo empresário Nadir Figueiredo) tem 9,2 cm de altura, 6,7 cm de diâmetro na ´boca` e um fundo de 4,5 cm. Cabe na mão como uma luva. Nada melhor do que beber uma cervejinha num copo desses.
A famosíssima caneta Bic azul é outra referência inabalável de perfeição de design. Foi criada em 1950 e continua bela, eficaz e insubstituível com seus 0,5 cm de diâmetro e, aproximadamente, 14,4 cm de comprimento. Escrever com ela, não cansa. Talheres pequenos ou grandes demais, não servem. Pratos quadrados nunca fizeram sucesso. E ninguém consegue desenvolver uma garrafa mais bonita e exclusiva do que a da Coca-Cola, que lembra um fruto do cacaueiro.
Para Felipe Sarmento, diretor da empresa alagoana Chroma e designer premiado nacionalmente (vencedor da House & Gift de Design em 1º lugar em três categorias na edição de 2012 com as suas criações ´Vaso Arraia´, ´Luminária Veneta´ e ´Cabideiro Rapel´), o design é fundamental para o sucesso de um produto. “Para mim, um design bonito junto com uma funcionalidade que traga conforto e bom manuseio de um objeto, seja ele um copo, um automóvel, um móvel ou até uma maçaneta, é fundamental e indispensável para o seu sucesso”, destaca Felipe. “Não tenho a menor dúvida de que um design agradável impulsiona a venda de um produto e separa algo do sucesso ou fracasso. As pessoas gostam de comprar coisas bonitas e funcionais”, finaliza.
Outro exemplo impressionante de sucesso de vendas e público é o Porsche 911. Esse esportivo alemão foi apresentado ao mundo em 12 de setembro de 1963 no Salão de Frankfurt, portanto ele já tem 61 anos. Nesse tempo, suas linhas básicas praticamente não foram alteradas de geração em geração. O Porsche 911 é como os Beatles: simplesmente agrada! E tal qual a calça jeans da marca ´Lee´, o VW Fusquinha, os óculos Ray-Ban, o tênis All Star e outros tantos produtos interessantes, por causa do design, continuam vivos e agradando sem fazer força.
A ergonomia e o design estão presentes em tudo: nas poltronas dos aviões, telas de TV, nas roupas, calçados, celulares, ferramentas, na engenharia e na arquitetura. Os funcionários de linhas de montagem de veículos são laboratórios vivos desses temas. Muitos deles literalmente ´vestem´ artefatos do tipo ´exoesqueletos´ eletromecânicos que os ajudam a manter a postura física e a cansar menos nos expedientes de trabalho. Até nas cédulas e moedas, esse universo está presente.
Dentre os carros que mais gostei e que se enquadram num esquema de quase perfeição na posição de dirigir, destaco quatro modelos: Mercedes-Benz Classe S (2013) e VW Nivus, BYD Yuan Pro e Ford Ranger (ambos, ano/modelo 2024). No frigir dos ovos, a ergonomia e o design dão o tom para a beleza ou feiura, para a complicação ou funcionalidade do mundo. (Imagem: Microsoft Designer Creator IA / Instagram: @acelerandoporai.com.br)