Tema recorrente, o caótico sistema de trânsito brasileiro sempre volta às pautas jornalísticas e, principalmente, ao nosso dia a dia como um assunto que reacende questões sociais. Mesmo com milhares de câmeras monitorando as vias, além de outros tantos agentes de trânsito a observar tudo, é impossível captar todas as infrações que acontecem ao volante. Como já comentei aqui nesse espaço, costumo prestar muita atenção no sistema viário. Com um placar bem acima do segundo colocado, dirigir falando ao celular é o absurdo mais recorrente. A questão é que agora o simples ato de (apenas) conversar utilizando o telefone portátil tornou-se o menor dos problemas. Pode observar: até os motoqueiros estão verificando mensagens na tela do celular enquanto guiam seus veículos que, pela obviedade do design, são menos seguros que um carro. Não há visão de Raio X do Superman ou agilidade do Homem-Aranha que evitem um acidente numa condição dessas.
Muitos cientistas da área médica estão apostando que um dos pontos centrais dessa questão preocupante é o excesso de dopamina gerado de uma maneira, digamos, forçada no cérebro. A dopamina (segundo definição neurológica) “É um neurotransmissor responsável por levar informações do cérebro para várias partes do corpo. A substância é conhecida como um dos hormônios da felicidade e quando liberada provoca a sensação de prazer, satisfação e aumenta a motivação”. Por exemplo: ouvir uma determinada música que traz uma saudade agradável ou saborear uma fatia do seu bolo predileto, geram a produção de dopamina. Se você realiza algo que gosta, a dopamina brota das enzimas inundando o cérebro de bem-estar. Isso inclui, também, ´gostar´ de utilizar o celular. Quando um ser humano pratica exercícios físicos regulares, bebe e come com moderação e se respeita entregando-se a momentos de lazer e de sono profundo, a dopamina chega nas doses exatas que o corpo precisa. O problema é que o carrossel global na internet jamais cessa de criar novidades, e todo mundo quer ver! A necessidade insana do consumo de ´drogas digitais´ gera todo tipo de malefícios. As pessoas – simplesmente – não estão mais parando! Depois de um dia extasiante de trabalho e tarefas familiares, elas levam seus celulares para a cama e partem para a etapa final de exploração de ´conteúdos´ até desabar de cansaço num sono raso e inadequado. Os famosos ´reels´, aqueles vídeos curtos que não param de saltar na tela, fisgam a mente numa ´quase´ hipnose extremamente cansativa aos sentidos humanos. Essa coisa do vício e desatenção por causa do celular é tão séria e ironicamente parecida com o consumo de drogas, que perante os formulários de acessos digitais, somos qualificados como ´usuários´. Já percebeu? Não somente nos problemas ligados ao trânsito, mas a dependência do uso de aparelhos eletrônicos já chegou a níveis absurdos com consequências perversas. Crianças (geralmente entre 8 e 13 anos) estão sendo internadas em clínicas de reabilitação, apresentando praticamente os mesmos moldes comportamentais de viciados em álcool e cocaína. Jovens infantilizados agora gritam dentro de casa por causa de manobras fracassadas em jogos de vídeo game… E tudo isso se reflete, também, no trânsito!
No frigir dos ovos, creio que parte desse desajuste reside no afastamento das pessoas da sua própria essência e da natureza em si: do sol, das plantas, do banho de cachoeira, do caminhar com os pés descalços no chão e da inobservância do movimento do tempo ao redor das nossas existências. Apesar da insistente conspiração da natureza para que os seres vivos possam coexistir em harmonia e plenitude, existe uma enorme desconexão, um desencaixe humano das suas funções originais. O isolamento do concreto na arquitetura, os solados de borracha nos calçados, a superexposição à luzes, sons, imagens e informações nas redes sociais já devem estar atrofiando a mente a ponto de fazer com que esse desastre interno repetido aos bilhões no mundo, reflita-se em irresponsabilidades sociais, como dirigir falando ao celular arriscando a própria vida e a dos outros. É inevitável desacelerar, realizar o famoso “freio de arrumação” interno em busca das verdades mais simples. É preciso descobrir, enfim, quem somos, pra quê viemos a este mundo, qual a nossa obra e quais as inutilidades que necessitamos descartar para seguir em frente e em paz. E sem pressa! (Fotos: divulgação Agência FBA / Instagram: @acelerandoporai.com.br)